1 – Você faz parte disso
Certa vez uma pessoa me disse que os debates sobre racismo são exagerados, pois ela não via razões para discriminar alguém por sua cor de pele. É um raciocínio romântico achar que, por não fazermos parte do grupo que discrimina, basta jogar o assunto para debaixo do tapete. Tendo o preconceito ao nosso redor diariamente, ainda que de forma involuntária, somos parte disso. Por exemplo, quando minimizamos a gravidade de um ato discriminatório ou quando presenciamos uma cena e não fazemos nada a respeito. Também fazemos parte quando não questionamos o modelo de sociedade que estamos vivendo. A não ser que você viva em uma realidade paralela, onde todos são iguais de fato, você faz parte disso.
2 – Violência gera violência
O racismo é uma forma de violência e, como tal, age em ciclos. Os contínuos esforços em manter a população pobre na periferia afastam seus moradores de condições decentes de educação, saúde e trabalho, corroborando para a manutenção da situação degradante dos moradores de áreas afastadas. A maioria da população moradora de favelas é negra, segundo estudo do Ipea, (http://www.dgabc.com.br/Noticia/103984/negros-sao-maioria-nas-favelas-aponta-estudo-do-ipea). O IBGE aponta que 1% dos moradores possui ensino superior. (http://www.dgabc.com.br/Noticia/492864/apenas-1-dos-moradores-de-favelas-tem-ensino-superior?referencia=relacionadas-detalhe-noticia)
Esta população está sensivelmente próxima da violência, fato comprovado pela pesquisa (http://jcrs.uol.com.br/site/noticia.php?codn=137497) que mostrou que a violência urbana está diretamente ligada à discriminação racial e social.
Este assunto é frequentemente apontado quando a criminalidade é discutida. Há quem não tolere a defesa de um criminoso, sob a alegação de que, como seres humanos cientes de seus atos, eles precisam apenas ser punidos e afastados – ainda mais – do convívio social. Como nosso sistema de reabilitação é bastante deficiente, o mais natural, embora trabalhoso para alguns, seria propor-se a estudar o cerne do problema, não apenas sua consequência. A população negra está marginalizada, pessoas marginalizadas não têm expectativa de vida e são mais facilmente coagidas a integrar grupos criminosos, não por escolha, mas porque todo o resto lhe virou as costas. O debate sobre a questão criminal no Brasil precisa se afastar de percepções emocionais e se aproximar da Ciência, e isto não é assunto exclusivo para sociólogos e juízes, é problema de todos os habitantes das cidades.
3 – Você sabe que é errado
Quando uma pessoa acredita que seu ponto de vista é minimamente razoável, ela o expõe com os argumentos que tem a seu alcance. Quando ela sabe que está errada, sai pela tangente, se esconde, faz piada, tenta justificar com sentenças sem pé nem cabeça. Racismo é crime, e é tão grave que as pessoas que o praticam sabem disso, e não raro se escondem sob o anonimato quando querem externar o que pensam de forma clara.
4 – As crianças não têm culpa
Além da densa discussão proposta no item 2, uma outra consequência grave da discriminação racial são os efeitos psicológicos em quem sofre e quem vê. É na primeira infância que o ser humano aprende valores que pautará seu comportamento para o resto da vida. A criação de estereótipos raciais firma nas crianças a ideia de separatismo. Atitudes pequenas como a naturalização de apelidos ofensivos e negação de características físicas de pessoas negras (lábios grossos, narizes grandes, cabelos crespos) tornam-se verdades na cabeça das crianças. Além do aspecto cruel de tornar crianças reféns de tal barbaridade, elas crescerão e se tornarão adultos que pautaram sua vida em atitudes de discriminação, o que ajudará a agravar os supracitados problemas com violência.
Lutar contra isso é apoiar uma sociedade mais justa, onde crianças estão livres da violência física e psicológica causada pelo racismo, e poderão se tornar adultos saudáveis e menos vulneráveis.
5 – Não faz sentido
No caso do Brasil, negros foram trazidos para cá num grande esquema de tráfico humano para serem utilizados como escravos. Mulheres negras foram objetificadas e reduzidas a objetos sexuais e amas de leite.
Como negros eram inferiorizados até praticamente não serem considerados humanos, criou-se, entre outras teorias absurdas, a ideia de que eram mentalmente inferiores do que brancos. Até hoje há quem defenda esta ideia torpe, muito embora a ciência tenha precisado perder tempo para provar o óbvio: não há superioridade mental branca.
6 – Não tem graça
Racismo não é humor, a não ser que o objetivo seja apenas reforçar os estereótipos preconceituosos que já vivemos. Um dos principais argumentos de defesa de quem é pego no flagra fazendo troça deste tipo é que era só uma brincadeira. Primeiro devemos ter em mente ninguém é obrigado a aceitar a brincadeira que for. Depois é preciso pensar o que você sentiria se fosse com você. Vale também tentar saber o que sentem as pessoas que são alvo destas brincadeiras.
Por último: simplesmente não tem graça. Há coisas engraçadas no mundo e o racismo não é uma delas. Chamar de macaco, cabelo de Bombril, dizer que, apesar de negra, a pessoa até que tem traços finos, chamar de cotista um negro no meio de um grande grupo de pessoas brancas, nada disso tem justificativa senão unicamente a ignorância.
Se alguém realmente acha que está certo por proferir piadas racistas e continua justificando isso com argumentos cada vez mais violentos, ele está errado.
De tempos para cá, muita gente reclama do politicamente correto.
O politicamente correto nada mais é que ética e respeito, é saber que não, não podemos tudo. E achar que pode usar alguém como alvo de piada preconceituosas e não querer enfrentar o que vem depois disso, é infantilidade, coisa de gente que não aprendeu desde cedo que não temos direitos sobre a vida do outro, tampouco temos direito de humilhar alguém por sua cor da pele – olha os efeitos do racismo na infância aí.
Aceitar com naturalidade o humor feito para humilhar o outro é gostar de viver em uma sociedade desigual, ponto contra o qual precisamos ir.
7 – É uma luta cansativa, mas é um trabalho em grupo
Lutar contra o racismo é uma guerra constante e pesada. É estar o tempo todo tendo que repetir as mesmas coisas para explicar ao racista por que o comportamento dele não tem motivo de ser. Mas, adivinha só? Como todo trabalho, este também traz mais resultados se feito em conjunto. É comum se sentir irritado ou entristecido com manifestações racistas, mas a militância diária dá resultado. Às vezes uma conversa basta. Às vezes é preciso ser mais enfático. Tudo depende de quão enraizado está o preconceito na vida de quem o pratica.
8 – Qualquer um pode fazer isso
Não é necessário participar de um grande grupo político para lutar contra o racismo, atitudes cotidianas também devem se tornar ponto de atenção. Questione-se porque há tão poucos estudantes negros nas universidades, repare na cor da pele dos jovens mortos por arma de fogo, se pergunte porque há empresas de empregados domésticos que tem a opção “cor” no formulário de preenchimento de requisição de funcionário.
9 – Você se beneficia de uma sociedade igualitária
Ter mais negros em altos cargos de trabalho, ocupando cadeiras universitárias e passeando pelas ruas sem estarem sob frequente estado de alerta para não serem apontados como criminosos em potencial torna a vida mais fácil a todos. Estar perto da população mais pobre também nos torna sensíveis às questões sociais e nos permite entender nosso papel na comunidade, pois é um erro crasso achar que pertencemos a algum grupo diferente. Nós apenas estamos em condições diferentes. A luta contra o racismo precisa ser de todos porque ela sedimenta as políticas que permitirão o desenvolvimento de todos os cidadãos, diminuindo a desigualdade social e, consequentemente, construindo um lugar melhor para todos.
Fernando moreira