Essa semana que passou minha mulher dispensou mais um empregada doméstica. A quarta em pouco menos de 3 meses. E apesar delas não terem sido registradas por causa do pouco tempo que ficaram (período de experiência), receberam todos os direitos que a lei garante a elas: salário, INSS, décimo terceiro e férias proporcionais e mais um agradozinho a título de FGTS. Sou correto e muito antes da nova lei, sempre fiz questão de pagá-las corretamente. Mas tem havido um problema muito grave aí: as domésticas não estão nem um pouco preocupadas em se profissionalizar para fazer jus aos seus novos direitos.
Todas as secretárias (prefiro chamá-las assim) que passaram pela minha casa nesses últimos meses, sequer conseguiram dar conta de metade das suas obrigações. E olha que aqui moramos numa casa relativamente pequena e somos apenas dois adultos e um bebê, sendo que a pequenininha ainda tem uma babá só pra ela. O que a minha mulher consegue fazer num período, nenhuma delas conseguia completar o dia todo. Sem contar nas tarefas feitas de maneira errada ou mal feitas. Quer exemplos? Um terno que foi parar na máquina de lavar, uma planta morta por excesso de água, coisas guardadas fora de lugar e que agora não se acha, pratos, copos e louças quebradas por desatenção e comida prontinha pra ser levada embora sem a devida autorização são apenas detalhes de uma lista imensa de problemas. Sem contar no consumo exagerado de gás, água e produtos de limpeza e o tempo idem falando ao celular durante o trabalho.
Nunca fomos carrascos, nunca exigimos cumprimento de horários e nunca fomos de passar o dedo por cima dos móveis pra saber se tem poeira. Mas agora, já que temos obrigações de lei a cumprir para com elas, nada mais justo do que exigir que elas sejam mais profissionais e eficientes.
É isso que tenho percebido na maioria dos lares que conheço. A PEC das domésticas garantiu novos direitos e trouxe mais benefícios a elas, mas está mudando em muitos casos a forma de relação entre patrões e empregados. E, digo, pra pior. Antes, até deixávamos passar muita coisa em prol de uma relação amigável, muito mais familiar. Agora tenho visto domésticas em casa de amigos batendo a mão na mesa dizendo que não faz mais isso ou aquilo, não fica mais até tal hora ou quer aumento porque o serviço é pesado. Oras, tudo bem! Mas e a contrapartida disso? Além de não apresentarem a experiência que desejamos, pior que isso é que elas ainda continuam - agora mais que nunca - saindo de casa depois de uma dispensa e batendo na porta da Delegacia do Trabalho para saber o que ainda tem pra receber.
Não éramos exigentes. Mas passamos a ser. E devemos ser! Afinal, uma secretária me custa quase dois mil reais por mês entre o que pago a ela e o que sou obrigado, agora, a pagar pro governo. E assim como qualquer outro funcionário de uma empresa, tenho o direito de cobrar, no mínimo, o cumprimento eficiente dos seus deveres. Não deu conta, a porta é a serventia da casa.
O que estou vendo é que a nova lei, muito além dos benefícios que trouxe, está é criando uma relação mais dura entre patrões e empregados domésticos. E com isso, outros benefícios reais que elas tinham como faltas não descontadas, objetos quebrados que não eram cobrados, dinheiro adiantado, a permissão para trazer os filhos ao trabalho numa emergência, ou presentinhos extras que sempre demos, estão se perdendo na rigidez dessa relação. É claro que há exceções - aqueles casos, por exemplo, em que a Dona Francisca está há mais de dez, vinte anos com a família e não pode ser tratada de maneira formal. Mesmo assim, tenho visto muitas "Franciscas" perdendo o emprego por causa das obrigações patronais.
Sei de história de famílias que acolheram em casa domésticas vindas de outras cidades. Sendo assim elas dormem no emprego, tem casa e comida de graça e ainda não tem despesas de água, luz, telefone, internet, etc. Fazer o que agora? Não permitir mais que elas durmam no emprego para não correr o risco de pagar horas extras e adicionais noturnos? Jogá-las na rua para que elas agora arquem com todas essas despesas de moradia? Ou será uma saída descontar delas a alimentação, parte da água, da luz e, quem sabe, um aluguel pelo quartinho? Analisando tudo isso, leva-se a crer que os trabalhadores domésticos ganham... mas perdem muito mais com a lei.
Não sei onde vamos parar. Usar a estratégia da diarista, com tudo isso, acabou se tornando inviável. Afinal tenho visto domésticas que cobravam 50, 60 reais antes, pedindo 150 pra trabalhar por apenas oito horas.
O governo, mais uma vez, se deu bem. Vai arrecadar mais com FGTS e INSS, e criou uma lei popularesca que vai lhe render mais votos. E nos nos demos mal. Além de pagar mais caro, teremos de nos contentar com esse nível de mão de obra. Afinal é o que tem pra hoje. E as domésticas? Será que se deram bem ou mal com isso? Só o tempo e as estatísticas vão dizer.
Ogg Ibrahim